domingo, 12 de agosto de 2012

Bendita Palmada!


Um pai vale mais do que uma centena de mestres-escola."
(George Herbert * 03 de abril 1593 + 01 de março de 1633).

Sábio é o pai que conhece o seu próprio filho.
(Wiliam Shakespeare * 26 de abril de 1564 + 23 de abril de 1616).

 O caráter pode se manifestar nos grandes momentos, mas ele é formado nos pequenos. Um Pai constrói Homens."
(Phillips Brooks * 13 de janeiro de 1835 + 23 janeiro de 1893).

“Comporta-te com teus pais como pretendes que teus filhos se comportem contigo. (Giacomo Leopardi *29 de junho de 1798 + 14 junho de 1837).

Bom dia!


Já tenho dito que quando faltarem às funções de meu corpo, meu cérebro vai continuar
funcionando.
Será o último órgão a parar em meu corpo.
A coisa mais remota que lembro em minha vida que posso contar: uma criança pouco mais que um bebê, com uma camisa branca de linho, uma calça azul clara com um suspensório do mesmo tecido, preso à calça na parte traseira da calça do lado direito, passando pelo ombro esquerdo abotoado com um botão branco. Tenho outra anterior mas, ninguém acreditaria.
Uma área de fundos, de cimento queimado do casarão, onde iniciava uma passarela de pedra, dividindo geometricamente o terreno, arborizado com árvores frutíferas, ao meio e que terminava ao fundo em uma pequena construção, moradia de meu avô.
Um homem de mãos hábeis entalhava uma cadeira alta para o filho caçula (eu) que estava abandonando a situação de bebê e precisava sentar-se à mesa com a família. Duas vezes o homem advertiu:
- “Não, nenê.” (Porque eu, o “nenê” insistia de tentar fazer na pedra da passarela o que ele fazia na madeira e, empunhando seu precioso formão Solinger na mão esquerda e o martelo na mão direita, encostei seu formão na pedra e já ia bater com o martelo quando fui impedido por uma bela palmada no popó, do lado direto). Ainda sinto a palmada!
Nunca mais tive que ser repreendido. Ali, naquele momento aprendi a respeitar aquele que viria a ser o único ídolo que tive na vida. O "Seu Zé", o meu pai.
Um homem de estatura mediana, extremamente forte, quanto um pai amoroso. Extremamente amoroso.
Um marido correto, um genro de respeito. Um verdadeiro orgulho para os filhos. Um homem de voz grave, mas, extremamente educado embora seu ramo rude de atividade. Palavras firmes.
Autodidata, sempre o lembro, a noite, recostado a cabeceira de sua cama com um bom livro, à luz do abajur de cabeceira e, aqueles óculos de estrutura marrom pesada.
Sabia de cor todas as capitais dos países do Mundo, incluindo as dos 135 países que formavam a cortina de ferro. E seus costumes!
E aquele homem extrovertido e alegre, sempre brincando, sustentou com a força de seu trabalho, mulher, seis filhos, sogro e sogra, uma sobrinha que um irmão, (meu tio destrambelhado) mandou do Paraná para ser criada por ele e, ainda, ajudava uma tia minha, viúva que tinha dois filhos.
Por isso, foi muito estranho para mim, quando tinha sete para oito anos de idade sua mudança. Aquele cujos olhos expandiam amor quando olhava sua prole, aquele homem brincalhão e extrovertido, calou-se.
Chegava do serviço ao final da tarde tarde, se preparava para o jantar, sentava-se a mesa com a família jantava e sentava em sua poltrona na sala, calado, olhando a televisão como se visse através e além dela. Dias, meses anos a fio. Soubemos que tinha uma doença no fígado. Depois que possuía uma úlcera no duodeno, Depois outros problemas.
E suportou calado enquanto seus filhos estudavam, e cresciam, e obtinham o primeiro emprego. Casavam-se e, partiam, cada qual cuidando de sua própria vida.
Lembro-me que quando o "Seu" João, o dono da padaria que nos servia adoeceu (Câncer na época era uma doença que repugnava e apavorava mais que a tuberculose) e os fregueses da padaria começaram a abandoná-la, muitos voltaram pela insistência de meu pai continuar sendo freguês e quando D. Alice, minha mãe, o questionava, ele respondia:
- "Ele nos serviu 20 anos enquanto tinha saúde. Agora ele precisa de nós. Ainda que eu seja o último freguês".
Estranhamente, pelo respeito que gozava na comunidade, muitos vizinhos, ainda com medo, voltaram a comprar na padaria. Nesse tempo Oswaldo, filho do “seu” João, estudava advocacia.
Viria mais tarde ser vereador Oswaldo De Rosis, Presidente da A. A. Portuguesa, presidente da Câmara Municipal de Santos e pai do Jogador Rui De Rosis, do Santos F.C. e do C. Atlético Mineiro.
Assim, cresci sempre ouvindo uma palavra de sabedoria. Já tinha me acostumara com esse novo perfil de só falar o estritamente necessário. Estudei, obtive um emprego sólido, casei e, logo no início do casamento quando todas as dúvidas e incertezas caiam sobre mim, aquele homem que fazia encomenda de um caminhão de material de construção com um papel amassado e, escrito e assinado a lápis, caiu de cama para não mais levantar-se.
Sua missão estava cumprida!
Lembro-me do Dr. Alberto Pessoa, autoridade em oncologia à época, contar-me que, ao ser comunicado de seu estado e sua internação imediata e incontinente, pediu vinte dias ao médico para encerrar seu último contrato porque o cliente não tinha culpa daquilo que ele já sabia. Entregou o serviço, apresentou-se ao médico e jamais retornou do Hospital.
Tomamos conhecimento, então, que o Câncer há anos, silenciosamente, corroia-o dia-a-dia. O que lhe dava forças: a determinação de acabar sua obra. A criação dos filhos menores.
Aí entendi o seu silêncio de muitos anos antes.
Por isso todos se espantavam em seu velório, naquela tarde chuvosa de 12 de janeiro de 1972, pois ainda assim recebia as visitas com um sorriso estampado no rosto, que a dor, a doença, tampouco a morte conseguiram arrancar. O sorriso da vitória. O descanso justo do Guerreiro (ele, o verdadeiro, não eu) após a certeza do dever cumprido.
D. Alice, minha mãe, lúcida, pouco tempo antes de falecer, disse-me ser impossível lembrar-me da calça azul de suspensório porque ela mesma a fez, em sua máquina Noiva e, eu tinha aproximadamente 02 anos de idade. Calei-me. D. Alice se assustaria se eu contasse de muitas outras lembranças desse e de outros tempos.
Houvesse espaço e tempo poderia escrever milhares de recordações, dos atos de caráter, da dignidade e, da hombridade de "Seu ZÉ", meu único ídolo. Poderia ficar aqui, infinitamente contando. Já que não posso, tampouco vocês, deixo-os, registrado o meu respeito, a minha saudade (Ah! "Seu Zezinho" Quanta saudade!) e o homenageio em nome de todos os pais com responsabilidades de pai, caráter de pai e, deveres de Pai.
Para esses, REPLETO E FELIZ DIA DOS PAIS!
Bendita palmada! Pudera estar aqui para dar novas palmadas toda vez eu merecesse!

Ora, bolas!

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